Oméia, rei do Iemen, tinha um tesoureiro chamado Quelal que
parecia muito cuidadoso e diligente nas contas. Querendo o monarca
certificar-se da honestidade de seu auxiliar, fez o seguinte: durante três dias
colocou, sem nada dizer, um dinar na caixa das despesas. Era claro que o
tesoureiro, no final do dia, ao apurar as contas, devia achar o excesso de um
dinar, que seria anotado, como saldo, no livro competente. O rei, entretanto,
observou que o tesoureiro não fizera o
registro daquela diferença durante os três dias. – “Naturalmente o ambicioso
guarda para si o dinar excedente!” – ponderou o rei. – Quem pudera imaginar
fosse o tesoureiro Quelal capaz de tal proceder? Convinha, porém, tirar a
prova, a verdadeira prova, isto é, a prova real. Durante os três dias seguintes
retirou secretamente da caixa um dinar, e esperou que o tesoureiro desse pela
falta e reclamasse a diferença! Mas qual! Nem assim. Diante dessas provas, que
lhe pareceram suficientes, Oméia chamou o seu grão-vizir e disse-lhe: - “É
preciso mandar abrir, com urgência, um inquérito. Tenho sérias razões para
desconfiar do nosso tesoureiro Quelal!” “Creio, ó rei”, ser desnecessário
investigar – contraveio o vizir. – Posso provar que o indigno Quelal não
procede nas contas com honestidade!” – “Como assim?” – perguntou o rei.
Respondeu o ministro: - “Saiba Vossa Majestade que resolvi, certa vez, apurar
se eram certas ou não as contas apresentadas diariamente pelo tesoureiro da
corte. Sem nada dizer, durante três dias, retirei da caixa a quantia de um
dinar. Pois bem. O tesoureiro nunca deu pela retirada feita por mim. A seguir,
também durante três dias, coloquei um dinar na caixa de Quelal, sem que ele
chegasse a registrar ou denunciar o excesso. Ora, quando um tesoureiro não
apura com rigor as diferenças de caixa é que a sua norma de proceder se aparta
dos princípios da mais elementar honestidade!”
Com sobeja razão assombrou-se o rei do Iemen ao ouvir o
relato do grão-vizir. Estava explicado o mistério do caso. São insondáveis as leis
do destino! Por extraordinária coincidência nos dias em que ele acrescentara um
dinar, o vizir retirara da caixa igual quantia. E ele o rei, nada fizera nos três dias subsequentes senão
retirar do diligente Quelal o dinar colocado pela astúcia do seu ministro.
Envergonhou-se, pois, o digno monarca da espionagem que fizera em torno de um
funcionário zeloso, que sempre se mostrar leal e dedicado. Praticara, afinal,
vários ardis anulados por outros tantos e levara a efeito várias fraudes
destruídas por outras fraudes.
Quando o ministro terminou o relato, o poderoso rei
levantou-se e declarou encarando-o fixamente:
- Suas palavras, ó vizir!, são a prova de que o nosso
tesoureiro Quelal é escrupuloso e honestíssimo em suas funções! Resolvo, pois,
não se cogitar mais de inquérito e seja o honrado Quelal mantido no cargo com
vencimentos dobrados.
O vizir, que ignorava, em absoluto, o segredo do caso, ao
ouvir essa inesperada sentença do rei, teve um ataque de coração e tombou
fulminado sobre os degraus do trono.